No dia 9 de abril do ano passado, saí completamente machucada e perplexa da reunião mais violenta da minha vida, que marcou o início de meses intensos e dolorosos, nos quais sofri assédio, intimidação e retaliação constantes, além de uma campanha para minar minha liderança, boicotar meu trabalho e me rotular como alguém que “não entende de negócios” e é “ativista demais”.
Quando percebi que minha vida seria um inferno até que eu cedesse e pedisse para sair, resolvi, pela primeira vez desde que entrei na organização, olhar para o mercado. No dia 28 de abril candidatei-me, meio que no impulso, para uma vaga na Amazon.
Ainda me recuperando de uma cirurgia, recebi um e-mail para a primeira entrevista com a Saori. Foi amor à primeira vista! Fiquei encantada com a postura, história profissional, assertividade e até o tom de voz dela me deixou animada.
Logo em seguida, recebi o e-mail informando que passei para a próxima fase: um painel de entrevistas com cinco pessoas de diferentes áreas e cargos.
Atolada e sobrecarregada por entregas importantes, viagens, qualificação do doutorado, e ainda tendo que me defender e ao meu time dos constantes ataques, mal tinha tempo para respirar. Mesmo assim, segui no processo e a última entrevista foi no dia 3 de junho com a Lu, profissional que vim a admirar demais e que acabou se tornando uma amiga.
Participei de tudo com um gosto agridoce na boca.
Não tinha expectativa de passar já que, além da minha autoestima profissional e pessoal estar sendo completamente destruída, descobri que os candidatos se preparam intensamente para esses processos nas Big Techs, até contratando mentorias especializadas.
Eu estudei um pouco nas madrugadas insones dos hotéis, mas, no geral, só pude contar com minha autenticidade, experiência e conhecimento para responder da forma mais verdadeira possível às perguntas.
Foi uma grande surpresa quando no dia 10 de junho recebi a ligação informando que eu havia sido aprovada e que receberia uma oferta de emprego naquele mesmo dia: o bote salva-vidas que eu tanto pedi ao universo, entre soluços, veio na forma de um iate de luxo.
Senti-me grata, privilegiada e valorizada, mas também muito culpada por não estar celebrando como deveria aquela oportunidade. Mais do que isso, eu estava triste por deixar meu time e colegas que eu adorava, projetos que sonhei, idealizei e gestei com amor e dedicação, além do sentimento de estar sendo “expulsa” de uma organização que acreditava ser o trabalho dos meus sonhos.
Era como se eu estivesse “saindo pela porta de trás”, com uma campanha de difamação rasteira executada pelo mais alto nível da organização, como contei aqui.
Aos poucos, a clareza de que eu havia tomado a melhor decisão, e de que a Amazon poderia me oferecer novas oportunidades de ser feliz profissionalmente, foi tomando conta de mim e substituindo a dor. Consegui tomar fôlego para recomeçar.
Cheguei à Amazon no dia 15 de julho em um misto de excitação, ansiedade e medo. Eu não era mais a mesma Tayná. Estava fragilizada, exausta, magoada, mas também determinada a fazer dar certo. Tinha mudado toda a minha vida para São Paulo, deixando minha família em Curitiba.









Na Amazon, encontrei um time respeitoso e acolhedor. Todos os processos — do recrutamento ao onboarding, passando agora pela minha licença e pedido de desligamento — foram funcionais, eficientes e absurdamente humanizados e gentis. Em pouco tempo, fiz amizades e senti-me em casa, mesmo diante do turbilhão pessoal que vivia.
Apesar da gratidão pelo recomeço, as crises de ansiedade continuaram, e se acentuaram por estar sozinha em São Paulo e pela sensação de que meu melhor não estava mais sendo tão bom quanto antes. Meu corpo e meu cérebro não respondiam aos comandos como antigamente.
Foi a primeira vez na vida que desabei completamente. Hoje, vejo que já estava doente quando entrei na Amazon. É por isso que me sentia pesada, com a visão turva, dificuldade de concentração e entregando bem menos do que sei que sou capaz. Quando desabei, foi impossível levantar sem apoio profissional intenso e, principalmente, sem voltar para casa para ser cuidada.
Mais: encontrei, no Shawn, um líder excepcional. Adoraria ter tido mais tempo para trabalhar com ele. Aprendi muito com seu estilo assertivo, sua inteligência brilhante, seu humor ágil e sua visão de processos. Sou e sempre serei extremamente grata pela humanidade e sensibilidade com que fui tratada por ele e por todos ao meu redor.
Eu poderia falar muitas coisas sobre como conheci profissionais extremamente competentes e inteligentes, como todo o time no Brasil e as incríveis mulheres que pude observar de perto no nosso time Global. Mas quero focar no ponto que considero mais essencial, até porque raro.
Quando adoeci, logo após as denúncias de assédio ganharem destaque na mídia e minha vida virar de cabeça para baixo, como já escrevi em outras ocasiões, absolutamente ninguém questionou, duvidou ou me fez sentir mal por estar adoecida.
Desde o dia em que compartilhei o que estava se passando recebi apenas cuidado, acolhimento e apoio. Mesmo quando comuniquei que não voltaria após a licença, que precisou ser estendida, me deram todo o tempo necessário para descansar e me recuperar, sempre de forma extremamente gentil em todas as comunicações. Nunca me esquecerei desse paradoxo (#entendedoresentenderão) e pode até ser que esta não seja a realidade geral e eu que eu tenha vivido em uma bolha. Se assim for, só posso agradecer ao universo por ter me poupado um pouco quando estava tão machucada. E ao Shawn por ter sido uma das lideranças mais incríveis que já tive na vida!
Hoje, despeço-me da Amazon certa de que, apesar de curta, essa experiência foi valiosa e necessária para minha recuperação e isso é, certamente, graças ao time incrível que encontrei lá!
#deuzmedibre romantizar o mundo corporativo, mas o vivi tempo suficiente para saber que empresas são feitas por pessoas e o universo foi muito generoso comigo, me presenteando com encontros realmente positivos nesta breve passagem!
Aprendi muito e sei que deixei minha marca, mesmo nesse momento tão desafiador!
Hoje saio convencida de que, mesmo nunca tendo planejado voltar a trabalhar em uma empresa desde minha transição de carreira em 2015, às vezes os caminhos que surgem são diferentes do que planejamos, mas podem ser positivos e até necessários.
Despeço-me desta etapa profissional ciente de que o descanso — e o tratamento adequado — curam dores que, enquanto as vivemos, parecem insuportáveis e de que está tudo bem se, de vez em quando, nosso melhor não for a nossa performance máxima, e que isso não nos diminui como profissionais.
Deixo a Amazon de cabeça erguida, certa de que entendo sim — e muito — de negócios, mas, antes de tudo, sou e sempre serei ativista. Em toda a acepção da palavra.
Não há outra forma de resolver as crises atuais e cumprir a missão histórica da nossa geração sem pensar no coletivo! Acredito cada dia mais nisso!
Nada nem ninguém, por mais poderoso ou violento que seja, será capaz de tirar o que tenho de mais precioso: minha capacidade de sonhar e agir de acordo com meus sonhos. Se isso significa "sair da linha", posicionar-me quando mais ninguém o faz, defender o que acredito mesmo que depois eu precise chorar em posição fetal, ou ser chamada de abusada, ousada, arrogante ou agressiva, que assim seja!
Eu sou feminista, e tenho sido mulher por muitos anos. Seria estupidez não estar do meu próprio lado. Maya Angelou
Inicio oficialmente meu mini-sabático para retornar quando estiver plenamente recuperada - com projetos de impacto focados no atendimento a vítimas de assédio corporativo com as energias recarregadas.
Por enquanto, quero agradecer a quem, durante todo esse processo, me deu colo e afeto. Quem me segurou para que a queda não fosse ainda mais trágica e, talvez, irreversível.
Um agradecimento especial à Laura, Bruna, Martha, Lu, além da Saori e as outras mulheres incríveis que conheci neste processo.
Como eu disse na edição passada aqui, não sei quando voltarei a trabalhar! Sei que o “mercado” não me receberá tão bem e é provável que a campanha de difamação tenha surtido algum efeito.
Assim que estiver de pé, seguirei dedicando toda a minha energia para que outras vítimas que queiram denunciar saibam que não estão sozinhas.
Nos vemos em breve, em novos caminhos e lutas!
Com amor, Tay ❤